Autoras: Amanda Becerra e Larissa Andrade
Editora: Vânia Bonato
Seminário apresentado junto ao Curso de Pós-Graduação em Imunologia Básica e Aplicada USP/RP
Uma das sensações mais conhecidas quando somos acometidos por uma infecção viral é o “sentir-se doente”, do inglês, sickness behavior. Essa sensação é explicada pelas modificações que o vírus promove no organismo, sejam pelos mecanismos de virulência ou pela resposta imunológica gerada. Uma dessas modificações está relacionada ao metabolismo: vias imunoendócrinas são acionadas, como a sinalização de IFN-I, IFN-γ e liberação de hormônios como a leptina, responsável pela sensação de saciedade. Dada a menor ingestão de alimentos, e, consequentemente, de glicose, vias alternativas são acionadas para manutenção da glicemia do indivíduo, como a gliconeogênese.
Na gliconeogênese ocorre a produção de glicose a partir de substratos não-carboidratos, como lactato, piruvato e aminoácidos. A insulina possui papel crucial para o controle da glicemia, e quando desregulada pode promover o desenvolvimento de diabetes. Agentes virais promovem aumento na captação de glicose por meio de aumento na expressão dos transportadores de glicose, aumento na expressão e na atividade de enzimas metabólicas. Nesse contexto, diversos grupos mostraram associação da prevalência da diabetes com infecções virais. Sestan e colaboradores (2018) descreveram que a infecção por citomegalovírus murino (mCMV) promoveu ativação de células NK produtoras de IFN-γ, que atuou no tecido muscular esquelético, induzindo resistência à insulina por meio da internalização do receptor para esse hormônio. Esse evento reduziu a ativação e a citotoxicidade de células T CD8+, pois tais processos requerem a via de sinalização da insulina.
Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho foi investigar como a infecção viral afeta a regulação da glicemia. Primeiramente, os autores investigaram o impacto da regulação dos níveis de glicose no sangue durante infecções virais, começando pela hipótese de que a gravidade da infecção estaria relacionada à queda nos níveis de glicose. Apenas em alta concentração de inóculo, mCMV causou redução significativa nas nos níveis de glicose nos camundongos. Esse padrão foi confirmado com infecções por vírus da coriomeningite linfocítica (LCMV) e com o vírus influenza A (IAV). A manutenção artificial de níveis elevados de glicose, induzindo hiperglicemia em camundongos, acentuou a replicação viral e mortalidade dos animais, indicando que a queda nos níveis de glicose pode desempenhar papel benéfico na resposta antiviral.
Em experimentos in vitro, os pesquisadores testaram se a restrição de glicose poderia inibir a replicação viral nas células-alvo, e os resultados mostraram que a baixa disponibilidade de glicose prejudicava significativamente a replicação viral em diferentes tipos de células, tanto murinas quanto humanas. Quando as células eram cultivadas com baixas concentrações de glicose, a produção de ATP mitocondrial era priorizada, enquanto em condições de alta glicose, a glicólise tornava-se a via predominante de produção de energia. A infecção viral não alterou significativamente essas escolhas metabólicas, mas os níveis de lactato aumentaram em condições de alta glicose, o que sugeriu um papel para o lactato na inibição da resposta antiviral. A restrição de glicose, ao reduzir a produção de lactato, promoveu resposta antiviral mais robusta. Esse efeito foi demonstrado tanto pela redução das cargas virais em condições de baixa glicose quanto pelo uso de um inibidor de lactato, que levou ao aumento da ativação dessas vias e, consequentemente, a uma resposta antiviral mais eficaz.
Os autores também observaram que a produção de IFN-I, especialmente IFN-β, era aumentada em condições de baixa glicose e inibida pela hiperglicemia. A produção de IFN-β foi essencial para o controle da replicação viral, como descrito no modelo experimental, sendo a administração de glicose suplementar associada ao pior prognóstico da infecção e com redução na produção de IFN-β.
Por fim, os autores buscaram entender qual mediador imunológico estava diretamente ligado à restrição de glicose e destacaram o papel do IFN-γ. Camundongos deficientes para IFN-γ ou tratados com anticorpos neutralizantes não apresentaram queda nos níveis de glicose, e a administração de IFN-γ confirmou seu papel central como mediador da hipoglicemia induzida na infecção viral. Esses resultados mostram que a restrição de glicose durante infecções virais é crucial para modular a resposta antiviral. A diminuição da glicose disponível leva à produção de ATP mitocondrial e inibe a glicólise, e a produção de lactato, reduzindo a replicação viral. O lactato gerado nesse processo atua como supressor das vias de sinalização antiviral, enfraquecendo a resposta imunológica. Além disso, a baixa disponibilidade de glicose diretamente ligada com a produção de IFN-γ, está associada ao aumento da produção de IFN-I, essencial para a defesa contra as infecções virais. Esse estudo destaca a importância da modulação do metabolismo energético e sua interface com IFN-γ e com IFN-I na infecção viral.
Figura 1: Em resposta a uma infecção com alta carga viral, ocorre quebra da barreira endotelial no baço, que ativa células Tγδ secretoras de IFN-γ. Junto com a IL-1β, o IFN-γ estimula a produção de insulina pelas células β pancreáticas, causando hiperinsulinemia. Isso diminui a produção de glicose pelo fígado, reduzindo a glicogenólise em jejum. A baixa disponibilidade de glicose aumenta a produção de IFN-I nas células periféricas, pois a inibição da sinalização de IRF3 e de NF-κB pelo lactato é reduzida. A hiperglicemia, por outro lado, suprime a produção de IFN-I, aumentando os títulos virais durante a infecção.
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