Autores: Keise Adrielle Pereira e Rhanoica Guerra
Editora: Profa Dra Vanessa Carregaro
Seminário apresentado na disciplina Tópicos Avançados de Imunologia do Programa de Pós-Graduação em Imunologia Básica e Aplicada da FMRP-USP
A psoríase é uma doença de pele inflamatória complexa que afeta aproximadamente 3% da população global. Por muito tempo, a manutenção dessa inflamação crônica tem sido atribuída a uma interação complexa entre fatores genéticos e ambientais, embora os mecanismos envolvidos no processo permanecem, em grande parte, desconhecidos.
Recentemente, um estudo inovador, que combinou modelos murinos de psoríase (Card14 E138A/+) e coortes de pacientes humanos, identificou um vínculo mecanístico claro: a inflamação psoriática é impulsionada por um metabólito microbiano de origem intestinal.
Publicado na Immunity, o trabalho demonstra que a microbiota intestinal, e não a da pele, exerce papel determinante na regulação da inflamação cutânea, abrindo novas perspectivas terapêuticas. Entre os achados centrais, os autores mostram que camundongos psoriáticos (Card14 E138A/+) desenvolvem inflamação espontânea na pele acompanhada por alterações no microambiente imune cutâneo e no perfil sistêmico de metabólitos.
A aplicação de antibióticos tópicos (tABX) nas lesões cutâneas não conseguiu melhorar os fenótipos psoriáticos, como a espessura da pele e características histológicas. Em contraste, a administração oral de antibióticos (ABXs), que comprovadamente altera a composição da microbiota intestinal, aliviou significativamente as manifestações clínicas, incluindo a redução da espessura da orelha, vermelhidão, escamação e infiltração celular na derme. Esses resultados sugerem que os sinais derivados das bactérias intestinais contribuem para o desenvolvimento da psoríase.
O estudo identificou a molécula responsável por essa comunicação: o Sulfato de Indoxila (I3S). Os autores encontraram a presença de microrganismos produtores de indol no intestino que atuam como condutores da inflamação psoriática. O I3S é um metabolito que se origina de um "revezamento metabólico" (metabolic relay) entre o microrganismo e o hospedeiro. Microrganismos intestinais produtores de indol (como E. coli, Clostridium spp. e Bacteroides spp.) convertem o triptofano da dieta em indol. A conversão subsequente em I3S ocorre no fígado do hospedeiro.
O I3S revelou ser um fator pró-inflamatório importante, altamente enriquecido no tecido cutâneo dos animais psoriáticos. Em camundongos psoriáticos tratados com antibióticos, a suplementação com I3S exógeno levou ao agravamento da espessura da orelha e acantose epidérmica, acompanhada pelo aumento da infiltração de células Th17 na pele. De maneira interessante, a colonização com uma cepa de E. coli geneticamente modificada para ser deficiente na produção de indol levou à redução da geração de I3S (tanto no soro quanto na pele) e mitigou a inflamação psoriática.
O I3S amplifica a inflamação cutânea ao modular um tipo específico de célula imune: as células Th17. O estudo mostrou que a pele lesionada em camundongos psoriáticos é dominada por células Th17, imitando de perto o microambiente imune característico da psoríase humana. Mecanicamente, o I3S potencializa as respostas das células Th17 ligando-se ao Receptor de Hidrocarboneto de Arila (AHR). Essa ligação ativa o AHR nas células Th17 para modificar a acessibilidade da cromatina (epigenômica) em locus de genes efetores chave, incluindo Il17a, Il17f, Il23r e Il21r. Esse mecanismo reforça a identidade e função das células Th17. Para confirmar o papel do AHR nas células T, a exclusão de Ahr específica em células T em camundongos psoriáticos protegeu-os do desenvolvimento da inflamação cutânea.
Em coortes de pacientes com psoríase, os níveis séricos de I3S demonstraram estar significativamente elevados em comparação com controles saudáveis. Além disso, os níveis de I3S no soro correlacionaram-se positivamente com a gravidade da doença. Em resumo, este estudo estabelece um vínculo mecanicista entre fatores microbianos intestinais e a inflamação cutânea, destacando que a microbiota e os metabolitos (I3S) são potenciais alvos terapêuticos para a psoríase. A modulação do eixo intestino-pele pode revolucionar o tratamento, especialmente para casos resistentes à terapia, focando na interrupção do "revezamento metabólico" que amplifica a resposta Th17.
Figura 1. Eixo intestino – pele. A disbiose intestinal (inferior) favorece a expansão de bactérias produtoras de indol, que metabolizam o triptofano dietético em compostos indólicos. Esses indóis são transformados no fígado em derivados sulfatos, sobretudo indoxil sulfato (I3S), que circulam pela corrente sanguínea e alcançam tecidos distantes, incluindo a pele. No tecido cutâneo, o I3S atua como agonista potente do receptor arílico (AhR) em células Th17, promovendo sua ativação e translocação nuclear, além de induzir um programa transcricional que intensifica a expressão de genes efetores Th17 (como Il17a/Il17f) e de receptores de citocinas que estabilizam e amplificam essa resposta. O aumento resultante na produção de IL-17A impulsiona o recrutamento inflamatório e a hiperproliferação de queratinócitos, culminando no fenótipo cutâneo característico da psoríase, marcado por manchas inflamatórias e espessamento epidérmico.
Referência:
1Wang, C. et al. Gut microbe-derived metabolites drive psoriatic inflammation via modulation of skin Th17 cells. Immunity 58, 2241–2255.e7 (2025).
- Apaixonados por Imunologia
- Comunicado
- Conteúdo Publicitário
- Curso
- Dept. Imunologia Clínica
- Dia da Imunologia
- Dia Internacional da Imunologia
- Divulgação científica
- Edital
- Especial
- Especial Dia da Imunologia
- Especial Doença de Chagas
- Evento
- Eventos
- Exposição COVID-19 da SBI
- História da Imunologia no Brasil
- Homenagem
- Immuno 2018
- Immuno2019
- Immuno2021
- Immuno2022
- Immuno2023
- Immuno2025
- Immuno2026
- IMMUNOLAC
- Immunometabolism2022
- Imune
- Imune - o podcast da SBI
- ImunoWebinar
- INCT Imuno
- Institucional
- IUIS
- Luto
- NeuroImmunology 2024
- Nota
- Nota Técnica
- Notícia
- o podcast da SBI
- Oportunidades
- Outros
- Parecer Científico
- Pesquisa
- Pint of Science 2019
- Pint of Science 2020
- Política Científica
- Sars-CoV-2
- SBI 50 ANOS
- SBI.ImunoTalks
- Sem categoria
- Simpósio
- SNCT 2020
- SNCT 2022
- Webinar
- WORKSHOP