Cristina
Desde o início da pandemia de COVID-19, pesquisadores de todo o mundo vêm observando que os homens podem apresentar formas mais graves da doença do que as mulheres. No Brasil, cientistas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FCFRP/USP) e colaboradores pertencentes ao consórcio de pesquisa ImmunoCOVID, realizaram um estudo para identificar as razões pelas quais os homens podem ser mais suscetíveis à COVID-19.
A pesquisa avaliou mediadores imunoendócrinos e perfis de expressão gênica, assim como suas correlações em uma grande coorte de controles e pacientes com COVID-19 com diferentes apresentações clínicas e gravidade da doença. Os resultados foram divulgados como preprint e submetidos para a revista The Lancet.
Primeiramente, o grupo de pesquisadores realizou uma análise por bioinformática em um banco de dados da FAPESP - que reúne informações dos laboratórios do Grupo Fleury e Hospital Sírio-Libanês. “Essa análise envolvia vários parâmetros de exames laboratoriais de pacientes com diagnóstico positivo de COVID-19. Através dela, verificamos que os homens brasileiros também têm desfechos mais desfavoráveis em relação às mulheres quando infectados pelo vírus SARS-CoV-2”, comenta a coordenadora da pesquisa, a imunologista Cristina Cardoso (FCFRP/USP).
O próximo passo foi observar uma coorte de indivíduos de Ribeirão Preto (SP), por meio da coleta de sangue para análises imunológicas e endócrinas mais detalhadas. Com as avaliações clínicas, investigação de prontuários e entrevistas com pacientes, os pesquisadores puderam focar nos resultados relacionados especificamente ao dimorfismo sexual e em como os hormônios atuam durante a COVID-19. Com os dados obtidos, foi possível desvencilhar as alterações vistas no sexo masculino de comorbidades como diabetes, obesidade, hipertensão e tabagismo dentre outras, além da idade, que também corrobora para os quadros mais graves da COVID-19.
Os pesquisadores observaram que em homens infectados pelo SARS-CoV-2, os níveis de mediadores da inflamação estavam elevados e correlacionados de forma inversa e significativa com os níveis reduzidos de testosterona, que foram parcialmente dependentes da idade e diabetes. De forma contrastante, a via de sinalização do receptor de andrógeno, relacionada à atuação da testosterona e de seu metabólito diidrotestosterona (DHT), estava significativamente aumentada em homens com COVID-19 grave, incluindo a alteração na expressão dos genes TMPRSS2 e SRD5A1, que codificam proteínas relacionadas à entrada do vírus nas células e à produção de DHT, respectivamente. De forma ainda mais interessante, quanto mais elevados os níveis de DHT nos homens, maior era o risco de óbito relacionado à doença.
“Além disso, foi possível identificar marcadores imunológicos e endócrinos, além de clínicos, que podem predizer a evolução da COVID-19 ‘não grave’ para a doença grave nos homens. Mostramos que algumas alterações identificadas na fase da doença leve-moderada e que envolvem inclusive a queda da testosterona, fatores imunológicos e idade acima de 50 anos, podem apontar quem são os homens com maiores chances de evoluir para a COVID-19 grave”, explica a imunologista.
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