Pesquisadores da USP investigam relação entre o novo coronavírus e problemas como hipertensão, doença pulmonar e insuficiência renal
15 de abril de 2020
COMPARTILHAR Facebook Twiter Google Plus

Um gene bastante ativo nos pulmões de pessoas que sofrem de problemas crônicos como hipertensão e doença pulmonar obstrutiva pode ser a chave para entender por que estes pacientes têm maior risco de desenvolver quadros graves de Covid-19. E também pode ser a chave para o desenvolvimento de medicamentos contra a doença. É o que sugere um grupo de cientistas da USP em um artigo compartilhado no repositório medRxiv em formato preprint.
Usando técnicas de bioinformática e uma abordagem da biologia de sistemas, os pesquisadores investigaram se a expressão de um gene chamado ACE2 em células do pulmão é diferente para pacientes de doenças crônicas e para indivíduos saudáveis. Quando um gene está mais expresso, significa que ele está ativo e produzindo a proteína que codifica.

Pesquisador Helder Nakaya

 
 
Segundo Helder Nakaya, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e coordenador da pesquisa, como o Sars-CoV-2, o causador da Covid-19 é um vírus novo para os cientistas, as hipóteses do estudo foram formuladas a partir do que se sabia sobre o coronavírus que causou a epidemia de Sars em 2003. Já se sabia daquela época, por exemplo, que o vírus da Sars usava a proteína codificada pelo ACE2 para infectar células humanas. No começo de março, uma equipe alemã demonstrou, em um trabalho publicado na revista Cell, que o Sars-CoV-2 infecta as células do pulmão seguindo o mesmo caminho de seu parente mais velho.
 
 
 
Mineração de dados e comparações
Para comparar a expressão de ACE2 em pacientes com doenças crônicas e os indivíduos do grupo controle, os pesquisadores da USP trabalharam com dados públicos da plataforma Medline. Eles levantaram mais de 8 mil artigos científicos indexados na plataforma que abordavam as doenças de interesse para o estudo, incluindo hipertensão, diabete, doenças cardiovasculares, doenças pulmonares, insuficiência renal crônica, câncer de pulmão e até tabagismo. Na sequência, mineraram os textos do levantamento inicial para filtrar apenas aqueles que tratavam dos genes relacionados a cada doença – entre eles, estava o ACE2.
A partir dos dados desses artigos, os pesquisadores puderam analisar mais de 700 transcritomas de amostras pulmonares de pacientes com comorbidades associadas à Covid-19. Transcritoma é um conjunto de moléculas de RNA. Por serem transcrições de pedaços do DNA, essas moléculas permitem aos cientistas identificar os genes que estão ativos em uma determinada célula. A quantidade de moléculas de RNA idênticas também é relevante, porque permite que os pesquisadores determinem quais genes estão mais ou menos expressos – ou seja, produzindo mais ou menos proteína.
O grupo liderado pelo professor da FCF descobriu que o gene ACE2 estava altamente ativo em pacientes com essas doenças, quando comparados ao grupo controle. A única doença crônica que ficou de fora foi a diabete tipo 2, pois não havia na base usada pelos pesquisadores dados para fazer a comparação.
Agora, a hipótese é que, quanto mais ativo estiver o ACE2 nas células dos pulmões, maior a chance de uma pessoa desenvolver um quadro severo de Covid-19. Para provar a associação, no entanto, ainda faltam experimentos de laboratório, já que o estudo foi feito em computadores. Nakaya conta que foi uma primeira experiência de trabalho totalmente não presencial, da qual participaram vários pesquisadores. “Todo mundo conectado, coordenado on-line e usando dados públicos para criar hipóteses e usar as ferramentas e conjuntos de dados certos”, conta o professor.
Além da associação entre o gene ACE2 e as comorbidades para a Covid-19, os pesquisadores também encontraram outros genes que podem ter papel importante na infecção pelo novo coronavírus e são potenciais alvos para o desenvolvimento de medicamentos. “A gente também foi procurar saber quais eram os genes associados ao ACE2, que regulam o ACE2”, diz Nakaya. Um deles, o RAB1A, é conhecido por seu papel em infecções por outros vírus. Entre os demais genes, alguns ainda estão envolvidos em processos epigenéticos.
Os resultados do estudo trazem desdobramentos. De acordo com o coordenador, o grupo já está investigando a relação da Covid-19 com outros tecidos do corpo humano e outras doenças. “Estamos analisando amostras de mucosa nasal de crianças, adultos e idosos para ver se os níveis do gene aumentam com a idade. Vamos olhar para outros genes também. Estou apostando no RAB1A, que pode ser interessante porque existe evidência para outros vírus”, comenta o pesquisador.
Fonte: Jornal da USP

Usuário
PUBLICADO POR
SBI Comunicação
CATEGORIA DO COLABORADOR
ver todos os artigos desse colunista >
OUTRAS NOTÍCIAS
O DNA mitocondrial liberado pelas células tumorais senescentes potencializa a imunossupressão das células mieloides através da via do cGAS-STING
SBI Comunicação
29 de agosto de 2025
Infecções virais respiratórias podem despertar células de câncer de mama dormentes no pulmão
SBI Comunicação
29 de agosto de 2025
Estresse crônico promove elevada permeabilidade intestinal e induz a produção de IL-22 que contraregula a ansiedade via neurônios
SBI Comunicação
29 de agosto de 2025